componentes do grupo

Componentes com junção dos grupos 2 e 6: Ana Elisa Souza Carao, Andressa Rodrigues, David Felberg, Poliana Trindade Linhares, Maressa Fernandes Valentim Vidal, Rodrigo Rodrigues Hortelan e Thatianne Trajano Da Silva

sábado, 18 de outubro de 2014

Na beira da praia, uma marcha cheirosa

POR ANA ELISA S. CARAO

A 12ª Marcha da Maconha do Rio reuniu cerca de 12 mil pessoas de acordo com a avaliação da Polícia Militar do Rio.



O taxista Vanildo Moretti se abalou de Magé, na Baixada Fluminense, para a zona sul do Rio com um dos cartazes mais emblemáticos da Marcha da Maconha, que levou mais de dez mil pessoas às ruas de Ipanema na tarde chuvosa do último sábado para reivindicar a liberação da droga em uma manifestação que simbolicamente misturava política e carnaval em quase tudo: do encontro de vítimas de doenças que podem ser tratadas com os componentes químicos da erva a humoristas do Pânico, de movimentos contrários ao modelo de repressão ao tráfico adotado pelo governo Sérgio Cabral a turistas curiosos, de simpatizantes da causa a maconheiros declarados.
Com uma declaração rabiscada em apoio ao presidente do Uruguai, José Mujica, que quatro dias antes assinara um decreto autorizando o Estado a controlar o cultivo e a venda de maconha e tornando o país o primeiro do mundo a legalizar a produção, comercialização e distribuição da droga, o cartaz sintetizava a esperança dos manifestantes. "Essa é a única marcha com cheiro", disse Vanildo, de 60 anos de idade e 45 de consumo usual de maconha.



A 12ª Marcha da Maconha do Rio reuniu cerca de 12 mil pessoas de acordo com a avaliação da Polícia Militar do Rio. A passagem dos manifestantes pela pista da Avenida Vieira Souto, um dos endereços mais caros da orla carioca, não teve incidentes. Antes da marcha, quatro jovens que se concentravam para o evento em Magé foram presos pela polícia porque alegadamente portavam a droga. Foi o único problema. A própria PM tratou de garantir a segurança da manifestação reforçando o policiamento com 300 homens. Exagero.
Embalados pelas músicas dos blocos Planta na Mente e Nada Deve Parecer Impossível de Mudar e por palavras de ordem como "Eu sou maconheiro com muito orgulho, com muito amor" e "Dilma Rousseff, libera o beque", os participantes só queriam reivindicar o que se pratica livremente no Posto 9, na Praia de Ipanema, onde os organizadores esperavam que a marcha fosse engrossada pelos banhistas que costumam se reunir nos dias de sol para se refrescar com mar e cerveja e relaxar com tragadas de maconha. Mas a chuva que voltou a cair forte exatamente às 16h20, horário mundial da maconha como apregoava o mestre de cerimônias do evento no microfone do carro de som, antecipou o encontro. A marcha que saiu com apenas 3 mil integrantes logo ganhou corpo.
A comissão de frente da manifestação foi formada por um grupo de pais e médicos que lutam pela autorização do uso da maconha no tratamento médico de crianças. A advogada Margarete Brito, que preside a Associação de Pais de Pessoas com Epilepsia (Appepe) e é mãe de uma menina de cinco anos que sofre epilepsia refratária, defende a desburocratização e o incentivo à pesquisa médica do canabidinol (CBD), um dos componentes da cannabis, que tem propriedades anti-convulsionantes. "O CBD obteve resultado milagroso, principalmente para portadores da síndrome de Dravet, um dos tipos de epilepsia", disse. Patrícia Rosa, mãe de uma jovem com epilepsia de difícil controle, capaz de sofrer 50 convulsões por dia, acabou deixando a filha em casa porque ele precisava dormir depois de mais uma crise, mas participou do ato para engrossar o coro da liberação. “O uso medicinal da maconha é uma questão humanitária”, afirmou.
A concentração, que começara duas horas antes, no Jardim de Alah, uma área que divide os bairros de Ipanema e Leblon, parecia antecipar um fracasso. Às 16h, se havia mil pessoas ali era muito. "O tempo não está ajudando", lamentava o vereador carioca Renato Cinco, do PSOL, coordenador da marcha. Um humorista e uma panicat do programa Pânico na Band aproveitaram para fazer entrevistas para a atração dominical com um imenso cigarro de maconha. O microfone do carro de som era ocupado por críticos da política de segurança do Rio de Janeiro ou por militantes de movimentos sociais que apenas queriam manifestar solidariedade à luta. "Eu não fumo, mas apoio. É fundamental que a maconha seja legalizada, porque a maconha é legal", disse Cíntia Dorneles, de 54 anos. "A política antidrogas só visa exterminar a juventude negra e pobre”, bradou Felipe, que se apresentou como estudante da Universidade Federal do Rio de Janeiro (URFJ), segundo ele o maior reduto de maconheiros da cidade. “Nenhuma droga mata tanto quanto a guerra às drogas da polícia do Rio”, afirmou a estudante Renata Matias, de 21 anos.
“O debate está avançando, mas ainda enfrenta grandes obstáculos no parlamento por causa da bancada fundamentalista do Congresso Nacional, que impede o avanço de qualquer pauta libertária”, disse Renato Cinco. “O Congresso precisa jogar com honestidade na discussão do tema da legalização da maconha e ouvir mais a ciência sobre o uso da planta para fins medicinais. O próprio escritório da ONU para drogas e criminalidade aponta que a guerra às drogas foi ineficaz porque produziu um número muito grande de mortes e o consumo não caiu”, afirmou o deputado federal Jean Wyllys, do Psol do Rio de Janeiro. "Usuário não é criminoso. Há uma ação no Supremo Tribunal Federal que pode acabar com a criminalização da maconha, mas o ministro Gilmar Mendes nunca apresenta seu parecer", disse Carlos Minc, ex-ministro do Meio Ambiente.
O modelo adotado pelo Uruguai pode ser a bandeira de luta que faltava aos defensores da legalização da maconha no Brasil. O projeto consumiu apenas quatro meses de discussão até se chegar às regras definitivas para o mercado de maconha no país. A legislação estabelece três formas legais de acesso à droga: a produção doméstica de até seis plantas por casa, a filiação a um clube de cultivo ou a compra em farmácias autorizadas. Tudo será controlado pelo Instituto de Regulação e Controle da Cannabis.
O presidente José Mujica defendeu o direito de o país experimentar alternativas para o controle das drogas, mas deixou claro que a lei não representa um culto à maconha. O governo ainda vai convocar as empresas interessadas na produção para conceder seis licenças para o cultivo, que poderá ser feito em terras públicas, sob vigilância de militares. Espera-se que a primeira safra seja colhida em seis meses. O comércio nas farmácias só deverá começar em novembro. Não se sabe se embalado pelo avanço uruguaio ou não, mas sintomaticamente uma dos gritos de guerra mais ouvidos na Marcha da Maconha do Rio foi o “não compre, plante.”


REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA 

Nenhum comentário:

Postar um comentário