componentes do grupo

Componentes com junção dos grupos 2 e 6: Ana Elisa Souza Carao, Andressa Rodrigues, David Felberg, Poliana Trindade Linhares, Maressa Fernandes Valentim Vidal, Rodrigo Rodrigues Hortelan e Thatianne Trajano Da Silva

domingo, 9 de novembro de 2014

Violência racial – A tentativa de redução do ser negro

POR ANDRESSA RODRIGUES         
Nas últimas décadas, a desigualdade racial existente no Brasil foi evidenciada por inúmeros estudos estatísticos, tendo como marco referencial as pesquisas de Nelson do Valle Silva e Carlos Hasenbalg, ambas de 1979. A antes idolatrada democracia racial foi desta forma desmascarada como mito, pois não condizia com os achados de pesquisa publicados por esses estudos, que indicava a existência de um processo histórico e persistente de marginalização do negro na hierarquia socioeconômica vigente.
Contudo, as causas e consequências dessa desigualdade ainda não são objetos de consenso dentro do âmbito acadêmico, uma vez que a denúncia dessa segregação veio acompanhada de um contraponto: a noção de que, embora exista racismo na sociedade brasileira, em se tratando de relações de sociabilidade e convívio entre brancos e negros, o Brasil ainda estaria em uma posição mais privilegiada se comparado a países que tiveram uma história de intensos conflitos e violência interracial, como as leis Jim Crow nos Estados Unidos e o Apartheid na África do Sul. Todavia, relatórios publicados nos últimos anos evidenciam um fenômeno contraditório a essa noção, o genocídio do povo negro, decorrente não só da formulação de políticas públicas que deixam de contemplar esse segmento da população, o que poderia ser enquadrado como “racismo institucionalizado”, mas também da marginalização histórica que aflige a população negra que a enclausura em espaços flagelados pela miséria e pela insalubridade.
 A partir desses achados um novo tipo específico de violência surge: a violência racial, ou seja, aquela cujos processos e consequências se direcionam a um grupo racial em particular, no caso, a população negra. Rodnei Silva e Suelaine Carneiro, autores do relatórioViolência Racial, uma leitura sobre os dados de homicídios no Brasil, apontam de forma pertinente de que a violência contra o negro não se esgota apenas no homicídio por ele sofrido, uma vez que “a preocupação com a violência deveria ir além da brutalidade que se encerra na morte. Ela deveria ser apreendida também no desrespeito, na negação, na violação, na coisificação, na humilhação, na discriminação [do negro].” Acreditamos ser por essa perspectiva que devemos discutir a violência a qual está submetida a população negra, de modo a poder englobar todos os tipos de violência que esse segmento populacional sofre por conta de sua posição social, tanto física quanto simbólica.
Um exemplo flagrante de violência racial e que tomou os noticiários nos últimos meses, tanto da mídia tradicional corporativa quanto nos espaços virtuais construídos pela mídia alternativa, o midiativismo, se trata das consequências causadas pela militarização em curso da periferia e da favela, que acaba resultando no acirramento dos conflitos nesses espaços, com maior número de desaparecimentos, autos de resistência e homicídios registrados. Vale destacar que tal violência atinge toda a população das favelas, incluindo brancos pobres; contudo, o processo histórico que envolve intrinsicamente a relação do povo negro com a favelização torna essa população alvo prioritário imposta pelo desenvolvimento da militarização.
Cabe aqui uma breve explicação sobre a marginalização do favelado. A imagem forjada do negro favelado como marginal, adepto ou conivente com o banditismo, tem forte influência na forma como é concebida a abordagem das forças policiais em indivíduos que se encaixem nos parâmetros identitários desse estigma, assim como influencia também o imaginário da classe média urbana que, sem dúvidas, é uma das bases de apoio e legitimação ao projeto das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) e a crescente militarização das favelas. O jovem negro é, portanto, o primeiro em ordem de importância para “tomar uma dura” que normalmente é vexatória, agressiva e extremamente humilhante, diferentemente do modo como se dá a abordagem a um branco de classe média em situação semelhante.
Os casos recentes dos assassinatos do dançarino Douglas (DG), da dona-de-casa Cláudia Silva Ferreira e do pedreiro Amarildo Dias de Souza, todos negros, ilustram esse cenário. Somente ao branco, mais especificamente à classe média branca, é dado o benefício da dúvida, o direito à defesa; ao negro, logo enquadrado como marginal ou bandido, em acordo com esse imaginário do estigma racial, é imposta a pena capital, sem direito a defesa ou presunção de inocência, colocando-o à mercê do julgamento do policial.
Como abordamos acima, não é apenas a violência física que viola os corpos negros; além disso, toda uma gama de valores erroneamente atribuídos, direitos negados, ausência de políticas públicas focalizadas e uma cultura de perseguição e marginalização coloca o negro em uma posição estrutural subalterna no quadro social brasileiro. Podemos exemplificar alguns desses fatores com fenômenos recentes como, além do genocídio do povo negro, a perseguição imposta às religiões de matriz africana, a repressão à cultura dos rolezinhos e dos bailes funks, o quadro desolador de estrutura de saneamento básico em periferias e favelas, a baixa inserção de pessoas negras no mercado de trabalho, no sistema educacional e até no campo simbólico da teledramaturgia, onde o negro sistematicamente assume um papel subalterno ou de vilão em relação ao branco, via de regra, sempre em papéis de não-protagonistas.
Ainda no campo simbólico, onde a violência não é menos concreta, não custa lembrar do concurso Miss Salvador, realizado em 2013, na capital da Bahia, onde todas as candidatas eram brancas em um estado onde os negros correspondem a 76,3% da população total, o que demonstra a imposição de um parâmetro ou ideal de beleza propagandeado por uma sociedade que deseja a todo custo rejeitar sua negritude e os traços físicos e estéticos consequentes da predominância negra e afrodescendente na população como um todo. A violência contra o povo negro, portanto, vai além daquela de ordem física, como no caso dos homicídios e desaparecimentos – ela também se reproduz no âmbito simbólico, da moral e da cultura.
Willem Schinkel, ao trabalhar com o conceito de violência, a define como umaredução do ser, ou seja, a redução de uma pessoa a apenas um de seus aspectos entre tantos outros desdobramentos possíveis em uma dada situação; as alternativas são inúmeras, mas a ação violenta direcionada a essa pessoa reduz e limita o espectro de possibilidades, onde a situação desdobra-se em apenas um resultado possível. Logo, a violência racial estaria por reduzir as possibilidades de ser da pessoa negra. Quando certos valores morais, estéticos e simbólicos, tradicionalmente brancos, são considerados como legítimos e como padrões os quais toda a sociedade deve seguir, temos um caso de violência simbólica, onde o negro é obrigado a sentir vergonha de si e abrir mão de valores que não se encaixam no padrão hegemônico, causando assim baixa autoestima e sentimentos de inferioridade e incapacidade.
Em concordância com essa constatação, algumas pesquisas que buscaram entrevistar candidatos negros ao vestibular apontam que estes normalmente optam por concorrer a cursos de baixa concorrência por se considerarem incapazes de competir no acesso a cursos mais valorizados, como medicina ou direito. Esse sentimento de incapacidade não é fruto apenas da má qualidade das escolas públicas nas quais eles estudaram, mas também da própria discriminação racial que eles são obrigados a conviver diariamente nessas escolas, onde professores acabam por dar mais atenção aos seus estudantes brancos, tendendo a acreditar que seus alunos negros não são capazes de desenvolver o aprendizado.
À visto disso, lutar contra o genocídio do povo negro é lutar contra todas as formas de opressão direcionadas a essa população, é lutar contra a redução do negro, contra a limitação de suas possibilidades e escolhas, uma vez que a violência simbólica na qual ele está submetido faz parte de um processo maior de marginalização e discriminação contra pessoas negras. Tal processo acaba por culminar no enclausuramento desse segmento populacional em espaços como a favela e a periferia, locais onde a vida cotidiana se encontra atualmente controlada pela militarização, além de sofrer com a invisibilidade, transformando-os em espaços esquecidos ou negligenciados pelas políticas não só de segurança pública, mas por outras que visem enriquecer a vida e o convívio cotidiano. Lutar contra o genocídio é, antes de tudo, lutar pelo empoderamento do negro frente a uma sociedade que a todo momento não hesita em lhe impor um papel de inferioridade, os reduzindo a um confinamento onde tudo que ele deve fazer é reproduzir os valores e os padrões hegemônicos, tradicionalmente brancos, em detrimento de seus próprios. É com base nestas reflexões que ressaltamos aqui a importância do engajamento de toda a sociedade nas mobilizações puxadas pelo movimento negro, como as Marchas contra o Genocídio do Povo Negro, que terão amplitude nacional e visam chamar atenção para os alarmantes indicadores referentes à violência racial verificados nos dados apresentados.

Referências:


    

segunda-feira, 27 de outubro de 2014

'Vamos iniciar o terceiro turno: de volta à luta nas ruas', afirma Guilherme Boulos

POR ANDRESSA RODRIGUES

Militante do MTST considera que o momento é de intensificação das lutas e que as reformas importantes não vão acontecer sem grande pressão popular

São Paulo – O coordenador nacional do Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST), Guilherme Boulos, se disse aliviado com a reeleição da presidenta Dilma Rousseff (PT), a quem o movimento apoiou por considerar que uma vitória do candidato derrotado Aécio Neves (PSDB) seria “desastrosa” para os trabalhadores. No entanto, ressalta que o movimento agora volta às ruas, pois “esse é o momento das grandes lutas para avançar no conjunto de reformas populares, que hoje estão bloqueadas no Brasil”.
Boulos disse não ter ilusões quanto à atuação do governo para avançar em processos como a reforma política e a reforma urbana, pois as alianças no Congresso Nacional continuam sendo as mesmas. “Para avançar no conjunto das reformas vai ser necessário um amplo processo de pressão e mobilização de rua e o MTST está se preparando para fazer parte disso”, disse, ampliando mais uma vez o escopo de atuação do movimento, agora com a reforma política.
Para ele, é uma ilusão acreditar que a mudança do sistema político-partidário, que a presidenta Dilma mencionou em seu discurso na noite de ontem (26), após a divulgação do resultado da eleição, como uma das prioridades de seu segundo mandato, vai se dar por um consenso com o PMDB ou PSDB. “Nem ela acredita nisso. Seria conto de fadas”, ironizou.

Além disso, embora considere importante e definitiva a atuação de um grande número de movimentos com causas distintas em prol de Dilma no segundo turno da eleição, Boulos acha difícil uma guinada voluntária do PT à esquerda.
“Ao mesmo tempo em que eles têm uma fatura mais forte com os movimentos, eles também têm uma fatura a pagar para os empresários e para o agronegócio que bancaram a campanha deles. E toda a base aliada no Congresso Nacional com quem eles vão recompor. Qualquer movimento nesse sentido vai depender de um amplo processo de mobilização popular.”
Para o militante, a polarização ocorrida no segundo turno da eleição não é negativa, embora não negue os “efeitos de barbárie”, como o preconceito destilado contra os nordestinos nas redes sociais. Ele avalia, porém, que não adianta a presidenta – e também o vice-presidente Michel Temer – discursar que este é um momento de unidade nacional, pois a divisão do país é um fato.
“Essa mobilização não se desmonta por um discurso. Ela está dada por razões objetivas, por um esgotamento do modelo econômico e de conciliação de classes que foram estes 12 anos. A elite esteve na rua, pró-Aécio, mas também houve mobilização popular. E que não vai acabar agora porque a Dilma se elegeu”, defendeu.
Boulos ainda destacou que o movimento não fez nenhum acordo com o governo Dilma em troca do apoio. “Quando resolvemos fazer o apoio crítico no segundo turno, isso não foi condicionado a qualquer apoio político. Foi pelo entendimento que o movimento tinha, e tem, dos riscos que estavam colocados. Isso em nenhum momento ofuscou as reivindicações e as críticas que o movimento tinha e continuará tendo ao governo do PT”, explicou.
Na pauta mais específica da moradia, o movimento vai defender transformações profundas no programa federal Minha Casa, Minha Vida, para valorizar a gestão direta por organizações populares – chamada modalidade entidades – e localização mais central dos empreendimentos, além da pauta sobre regulamentação do reajuste dos aluguéis. “Esse é um desafio para o próximo período”, concluiu Boulos.
Sem terra
Em nota o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) manifestou similar à do MTST, destacando o esgotamento do modelo de crescimento em que "trabalhadores e patrões ganham" e a composição mais conservadora do Congresso Nacional a partir de 2015. "O próximo governo terá de escolher quem vai sair perdendo, e nós precisamos lutar para que não sejam os trabalhadores."
O movimento avalia como pontuais as medidas da gestão petista em favor das famílias mais pobres da zona rural nos últimos 12 anos e que a reforma agrária dificilmente será proposta pelo governo ou pelo Congresso, mas sim por pressão dos movimentos sociais. "O que o PT fez não foi reforma agrária, foi política de assentamento", diz outro trecho do documento.

REFÊRENCIA

Movimentos sociais prometem reforçar lutas por seus objetivos

POR ANDRESSA RODRIGUES
SÃO PAULO - Embora coletivos e organizações sociais - como os sem-terra, os sem-teto, os atingidos por barragens, as Mães de Maio, grupos negros, entre outros - tenham declarado apoio à reeleição de Dilma Rousseff, a depender dos movimentos sociais, a presidente não terá vida fácil nos próximos quatro anos.
- Indicamos o voto crítico na Dilma, o que não quer dizer que aceitamos suas políticas. Continuamos mobilizados e iremos para a luta na rua - afirmou Josué Rocha, um dos líderes do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), que agrega 40 mil famílias e fez grandes manifestações no período da Copa.
Rocha prossegue:
- Reconhecemos avanços, mas somos críticos porque o Minha Casa, Minha Vida privilegia mais as empreiteiras do que a população de baixa renda. Mas, diante do Aécio, que seria um retrocesso, não tínhamos opção.
O mesmo raciocínio foi adotado pelo Movimento dos Trabalhadores Sem Terra, que pretende intensificar as ações em 2015. Segundo o movimento, 120 mil famílias devem ser mobilizadas em acampamentos e ocupações já no início do próximo mandato:
- Dilma não assentou quase ninguém. Mas temíamos que Aécio ganhasse e voltassem massacres, como o de Carajás, a criminalização do movimento, por isso fomos com ela - disse Alexandre Conceição, da coordenação nacional do MST.
A reforma agrária foi praticamente paralisada na gestão Dilma. Ela assentou pouco mais de 10% do total assentado por Lula e ficou atrás até do governo Fernando Henrique. Outro ponto sensível nos últimos quatro anos é a demarcação de terras indígenas. A presidente homologou apenas 11 áreas, quase o mesmo que Lula fez por ano e menos do que a média anual de FH.
- Durante a gestão dela, a presidente nos recebeu uma única vez, logo depois das manifestações de junho de 2013 - afirmou Lindomar Terena, coordenador executivo da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil. - Na prática, as condicionantes estabelecidas pelo Supremo estão sendo usadas para dificultar a demarcação, e ninguém beneficiou mais o agronegócio do que a Dilma. Nossa saída é a luta.
Os movimentos sociais também se queixaram do Congresso formado em 2014, cujo perfil é mais conservador do que o anterior. Tanto MTST quanto MST acreditam que isso dificultará uma reforma política, tida como prioridade para os grupos.
Para as Católicas pelo Direito de Decidir, o desafio será evitar retrocessos, explica a coordenadora Rosângela Talib:
- Vai ser difícil avançar na descriminalização do aborto, mas vamos continuar pressionando pela regulamentação dos casos em que já é legal. Os próximos quatro anos não vão ser fáceis.

REFÊRENCIA:

Código Florestal: defesa do direito à terra ou privatização dos bens comuns?

POR MARESSA FERNANDES VALENTIM VIDAL

Brasil - MST - [André Barreto e Pedro Martins] Atualmente, está em curso uma corrida para a inclusão das florestas, campos, conhecimentos tradicionais e riquezas de nossa biodiversidade como mercadorias e títulos financeiros em Bolsa de Valores, sob a alegação que seria a única forma possível de manter a "floresta em pé".
Ou seja, o ônus da destruição dos territórios, expulsão dos/as camponeses/as, comunidades e povos tradicionais de suas terras, degradação da biodiversidade não seria do capitalismo selvagem, pelo contrário, ele seria a solução para esses problemas. Este processo é o que se chama hoje de "Financerização da natureza e dos bens comuns".
É nesse contexto que há uma aproximação da questão agrária com a questão ambiental: as "falsas soluções" antes anunciadas por setores ruralistas e rentistas do capital financeiro para "superação" da reforma agrária agora fazem propaganda de "oportunidades de negócio" que supostamente conciliariam a proteção do meio ambiente com os negócios corporativos. Basta ver, neste primeiro semestre de 2014, a campanha de publicidade realizada pela Bolsa Verde do Rio de Janeiro nos estados do Pará e Mato Grosso para promoção do instrumento da Cota de Reserva Ambiental (CRA) e da realização do Cadastro Ambiental Rural (CAR) – mais a frente voltamos a esses pontos.
Porém, essa aproximação entre o "ambiental" e o "agrário" também se reflete nas lutas sociais e populares, uma vez que no plano das estratégias e táticas dos movimentos sociais do campo cada vez mais os temas ambientais permeiam as discussões e ações de defesa do direito à terra e ao território. É exemplar disso a decisão de várias organizações do campo (camponesas, sindicatos rurais e quilombolas) de assumir para si a realização do CAR em seus territórios. O que estaria por traz dessas decisões políticas? Por que é estratégico assumir um papel que em tese deveria ser do Estado?
Para se refletir sobre tais questões, é importante primeiro debater alguns desses termos acima falados. O Cadastro Ambiental Rural, o tão falado CAR, foi criado no Novo Código Florestal (Lei 12.651 de 2012) e é parte de um sistema de controle, proteção e recuperação das áreas florestais em imóveis rurais. Assim, ao ser um cadastro composto de informações ambientais e fundiárias de todos os imóveis rurais (propriedades e posses privadas e públicas, individuais e coletivas) do Brasil, ele tem a função principal de controlar o desmatamento e identificar as áreas que necessitam de recuperação de sua cobertura vegetal.
O meio burocrático adotado desse cadastro é o registro eletrônico nos órgãos públicos ambientais – Secretarias de meio ambiente e IBAMA, sendo obrigatório. As informações que devem constar nesse cadastro são: identificação do proprietário/posseiro; identificação do imóvel rural; perímetro do imóvel rural; áreas de interesse social e de utilidade pública; áreas com remanescentes de vegetação nativa; APP e área de Reserva Legal; áreas de uso restrito, áreas consolidadas.
E por que ele seria parte do que se falou antes como "falsa solução" ou estaria dentro dos instrumentos de manutenção da "floresta em pé" como oportunidade de negócio? Como já se diz: informação é poder... no caso aqui, poder econômico. Ao se ter um cadastro, ou seja, uma rede de informações e mapas constando todas as áreas de cobertura vegetal e florestal ainda existentes no país, cria-se para o mercado as informações necessárias para se ter a noção exata da demanda e oferta por títulos financeiros que sejam representativos dessas áreas para a compensação de outras já desmatadas – a Cota de Reserva Ambiental (CRA), acima falada, bem como outros instrumentos, a exemplo dos créditos de carbono e outros que se inserem no pacote que se chama Pagamento por Serviços Ambientais (PSA). Todos esses são mecanismos da "Financerização da natureza e dos bens comuns", ou seja, tornam as áreas verdes em mercadorias a serem negociadas no mercado, as quais antes eram tidas como bens de uso comum do povo, e ocasionam a perda da soberania dos/as camponeses/as, povos e comunidades tradicionais sobre suas terras e territórios. Na prática estes perdem os direitos sobre tais terras, tão essenciais para o acesso a outros direitos.
Mas e por que os movimentos sociais do campo estão encarando como importante realizar o CAR? Sob a mesma premissa de que "informação é poder"... neste caso, "poder popular" e pelas suas implicações agrárias. Ao ser o CAR obrigatório, como consta na Lei Florestal, ou seja, todos os possuidores e proprietários de imóveis rurais (particulares, coletivos, assentamentos) devem fazer para estar regulares na questão ambiental e fundiária. Sendo que, ao se constarem as informações ambientais, mas também das formas de uso e manejo do território no sistema do Cadastro, este vem a ser um interessante instrumento para a oficialização e a visibilização dos conflitos agrários e socioambientais, das formas de uso coletivos e diferenciados dos territórios (mesmo aqueles ainda não regularizados), da ação dos grileiros e dos supostos proprietários invasores dos territórios tradicionais e áreas de assentamento. Em grande parte, isso porque surgem as "sobreposições" das declarações e informações prestadas quanto aos territórios e imóveis rurais e permitem a caracterização de mais elementos para provar o conflito agrário e socioambiental, o que ajuda na sua mediação e resolução na tutela de tais direitos.
Assim, conclui-se com uma reflexão: "os momentos de crise e as contradições também são propícios para avançar na luta social e popular" – justo ai reside a contradição intrínseca ao Estado. Mecanismos importantes para o Estado burocraticamente controlar e realizar suas políticas e programas públicos, neste caso de recuperação e proteção de áreas ambientais, mas atrelados também ao processo do mercado de apropriação privada dos bens comuns e da natureza, podem também ser uma arma para contribuir na luta de afirmação e defesa de direitos. Tem-se porem que ter clareza das contradições presentes nestes mecanismos, para não se cair em "cantos da Sereia". Contribuindo nas lutas populares, o Grupo Carta de Belém vem lutando na crítica às "falsas soluções" e na construção de alternativas verdadeiramente populares para o campo e florestas.

REFERÊNCIA:

domingo, 26 de outubro de 2014

MODULO 5 A TRANSVERSALIDADE DE GÊNERO E RAÇA NA GESTÃO PÚBLICA

UNIDADE I
MARCOS HISTÓRICOS, CONCEITOS E INSTITUCIONAIS DAS POLÍTICAS PÚBLICAS DE GÊNRO E RAÇA

POR MARESSA FERNANDES VALENTIM VIDAL

Globalização e movimentos sociais: novos desafios para o Estado e sociedade
No século XX, a partir da globalização os movimentos sociais atravessaram fronteiras, ultrapassaram os espaços locais e nacionais de modo que articularam objetivos comuns.
(segundo Scherer- Warren. 2006,p.01.),  Houve ampliação nos movimentos sociais que começaram a reivindicar questões de identidades, reconhecimento e redistribuição com finalidade de centralidade do movimento operário, como formas discriminatórias e de dominação nas relações de gênero,étcnicas, etárias, ecológicas, de apropriação de patrimônios históricos e culturais, conflitos bélicos e outras.
Os movimentos sociais no século XX tiveram diferença em relação aos movimentos anteriores, pois obteve maior visibilidade e centralidade nas redes transnacionais, com demandas e investimentos culturais e devido a sua amplitude entraram na agenda política da maioria dos países, através de sujeitos coletivos da sociedade.
Contudo, A partir da realização das conferências internacionais de mulheres, direitos humanos são exemplos de força política, dos quais houve articulação entre as conferências, estados nacionais, movimentos sociais, ativistas, entre outros, em único fórum de forma a definir as politicas de direitos humanos, gênero e racismo.
Conferências de Beijing (1995)e Durban (2001) fortaleceram a inclusão de politicas publicas de gênero e raça nas agendas nacionais.
Conferências Internacionais sobre mulheres no México em 1975, Nairóbi em 1985 e Beijing em 1985, combate ao racismo, ao sexismo e a xenofobia em 1978,1983 e 2001. Convenção sobre a Eliminação de todas as formas de Discriminação contra a Mulher - CEDAW em 1979, precedido pela Conferência Mundial do Ano Internacional da Mulher, que aglutinou mulheres de todo o mundo em 1975, o Brasil ratificou o CEDAW em 1984.
II Conferência Mundial de Direitos Humanos ocorreu em Viena no ano de 1993. IV Conferência Mundial sobre a Mulher, em 1995: a plataforma de ação adotada em Beijing.  III Conferência sobre Racismo, a Discriminação Racial, a Xenofobia e Intolerância Correlatas: ocorrido em Durban em 2001.

Redemocratização e reforma do Estado Brasileiro
A redemocratização do Brasil foram dois processos de transição que acabaram com os regimes ditatoriais. No primeiro momento em 1945, com o fim do Estado Novo de 1937-1945, acarretou uma estruturação das bases do chamado nacional desenvolvimentismo, onde o modelo de orientação econômica implementado no Brasil na Era Vargas se desloca do modelo agroexportador do cultivo e da exportação do café para o modelo urbano-industrial, que promove a industrialização no país, no segundo momento golpe militar em 1964-1985, implementação de uma reforma gerencial na administração pública Brasileira que privilegiou a descentralização e a autonomia de autarquias, fundações e empresas estatais de modo a conferir agilidade ao Estado. Principais características desse regime foram cassação aos direitos políticos de opositores, repressão aos movimentos sociais e manifestação de oposição, censura aos meios de comunicação, aproximação dos Estados Unidos no controle dos sindicatos, implantação do bipartidarismo, arena governo e MDB oposição controlada, enfrentamento militar, uso de métodos violentos. Tortura, contra opositores ao regime, Milagre econômico sendo forte crescimento da economia entre 1969 a 1973 com altos investimentos em infraestrutura, aumento da dívida externa, e o terceiro momento a Nova Constituição de 1988, com fortalecimento dos princípios da  legalidade, publicidade a partir do controle externo e da descentralização, com ruptura do modelo desenvolvimentista e iniciativas de reforma do Estado. Governo Fernando Collor (1990 – 1992) privatização, liberação  comercial e abertura da economia, com isso aumento do desemprego e recessão no país.
Governo Fernando Henrique Cardoso (1995 – 2002) o Estado adquiriu centralidade através da criação do Ministério da Administração e Reforma do Estado – Mare, onde designou a competência do Estado diante do emprego do poder e recursos públicos. Implantação do neoliberalismo, criação do plano real e favorecimento das privatizações.
Contudo o Estado assumiu responsabilidade o controle de formulação de politicas públicas, leis e execução de secretarias e departamentos, nesse sentido a expansão de Ongs, Organização Social (OS), Lei 9.367, de 15 de maio de 1988, autorização do poder executivo a transferir execução de serviços públicos e gestão de bens, recursos humanos e entidades especialmente qualificadas, Organização não governamental (ONG) entidades de direitos privados sem fins lucrativos, função de preencher lacunas do Estado, com atendimentos a pessoas cerceados dos seus direitos básicos “assistencialismo” e Organização da Sociedade Civil de interesse público (OSCIP) no texto são definidas que: pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, instituídas por iniciativa de particulares, para desempenhar serviços sociais não exclusivos do Estado, com incentivo e fiscalização do poder público, mediante vínculo jurídico instituído por meio de parceria.
Estado Mínimo - Corrente de pensamento na defesa de medidas a favor da economia de mercados, que visava a recuperação da economia dos países latinos – americanos (implantação do neoliberalismo), reforço da governabilidade, patrimonialismo e participação social.
Governo Luís Inácio Lula da Silva (2003 – 2006) associado ao fortalecimento da cidadania,democratização e atribuição do novo papel do Estado. Importantes aspectos: dimensões accountability (ideia de responsabilização, controle e fiscalização dos agentes públicos), controle social (participação da sociedade no acompanhamento e verificação das ações da gestão pública e execução das politicas públicas de renda, gênero e raça.    
Princípios e Conceitos de Interseccionalidade, Intersetorialidade e transversalidade.
Abordaremos os Conceitos: Interseccionalidade, Intersetorialidade e transversalidade.
Intersetorialidade: Compreensão de que gestão de politicas sociais, consequente serviços públicos, deve ser realizados por meio de ações integradas.
Interseccionalidade: complexidade da situação de indivíduos e grupos, considerando a coexistência de eixos de subordinação, consideradas discriminações de determinados grupos sociais de gênero, raça e orientação sexual, onde somatiza-se desigualdades sociais.
Transversalidade: na perspectiva de gênero incorpora a melhoria do status das mulheres em todas as dimensões da sociedade, econômica, politica, cultural e social, nas esferas jurídicas e administrativas, pontuando mudanças imediatas relativas à remuneração, acesso a educação, segurança social, saúde, além da partilha da responsabilidade profissionais e familiares, paridades nos processos de decisão (ferramentas analíticas de desigualdades ).
Todos os conceitos fundamentais para Implementação de Secretarias de Politicas para Mulheres e de Promoção de Igualdade Racial.
A Secretaria de Politicas Para as Mulheres: Origens, Missão Institucional e Estratégias de Gestão
A partir de uma ação do Estado ocorreu criticas que impulsionaram na reformulação das politicas públicas de gênero. Na década de 1980, implantaram a primeira Delegacia de Policia de Defesa da Mulher (1985), o Conselho Estadual da Condição Feminina (1983) no Estado de São Paulo, a nível federal a implementação do Programa de Assistência Integral á Saúde da Mulher (PAISM em 1983) e o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher  (CNDM em 1985).
Os movimentos feministas e de mulheres e o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher foram fundamentais para reivindicações e inclusão explicita na carta das mulheres aos Constituintes (1988), temas de saúde, família, trabalho, violência, discriminação, cultura e a propriedade da terra.
Em 2002 foi criada a Secretaria dos Direitos da Mulher (SEDIM), subordinada a Secretaria de Justiça. Em 2003 foi criada a Secretaria de Politicas para Mulheres (SPM), tendo finalidade de propor, coordenar, articular politicas públicas dirigidas a eliminação de discriminação de gênero. Através dessa criação representante da sociedade civil, governo e o controle social.
No ano de 2004 ocorreu o I Plano Nacional de Políticas para as Mulheres, convocadas pelos Conselhos a partir das Conferências Nacionais de Mulheres  e Conferência Nacional, propondo ações na construção de politicas públicas.
II Plano Nacional de Políticas para as Mulheres, participação da sociedade, parcerias e atuações intersetoriais como: autonomia de igualdade, educação inclusiva, não sexista, direitos sexuais e reprodutivos, enfrentamento da violência, enfrentamento ao racismo, jovens e idosas, sexismo e lesbofobia, monitoramento e gestão de planos dentre outros.
Gestão de Planos e execução, monitoramento das ações, criação de secretarias e ministérios responsáveis para execução dos planos e ações. Criação de secretarias governamentais municipal e estadual para gerenciamento de políticas para as mulheres, transversalidade de gênero nas políticas públicas,Lei Maria da Penha de nº11.340 de 2006, fortalecimento de mecanismos institucionais de politicas para mulheres. É importante focalizar os planos Municipais e Estaduais no seu desenvolvimento.
A Secretaria de Politicas de Promoção da Igualdade Racial: Origens, Missão Institucional e Estratégias de Gestão
 A criação da Secretaria para Promoção da Igualdade Racial – SEPPIR, em 2003, com objetivo de garantir políticas públicas de enfrentamento contra o racismo e o Estatuto da Igualdade Racial e as políticas de ação afirmativas. O movimento negro nasceu da inquietude da população negra ao não aceitar as diversas formas de racismo, preconceito e opressão vigentes historicamente na sociedade. Novas reivindicações foram sendo integradas à luta impulsionando o ativismo negro a buscar qualificação, articulações e a ocupar os espaços.
Na Constituição de 1988, alguns princípios citados a favor da luta contra o racismo: reconhecimento do direito a posse de terra às comunidades quilombolas e a criminalização da discriminação racial, marco jurídico que passou a disciplinar e a coibir a pratica do racismo.
 O Programa Nacional de Direitos Humanos – PNDH I, proposto em 1996, foi referência normativa para enfrentamento dessa questão). Marcha do Zumbi, foi de grande relevância para efetivação das politicas públicas de recorte étnico –racial.  Em Durban na África do Sul no ano de 2001, A Conferência Mundial contra o Racismo, Discriminação, Xenofobia e Intolerâncias Correlatas, contribui nas ações de metas, medidas e plano de ação para eliminação contra o racismo ocasionando o Brasil signatário da Plataforma de Ação de Durban, onde fortaleceu a demanda por ações afirmativas e politicas de reparação a grupos étnicos.
No ano de 2009, O Plano Nacional de Promoção da Igualdade Racial (PLANAPIR) com ações de implementação de politicas públicas nas áreas de trabalho, emprego, renda, cultura, comunicação dentre outros, Ações importantes e fundamentais do deste governo é a Lei 10639/2003, que institui o Ensino da História e Cultura da África e dos Afro-brasileiros e da Lei 11.645/2008 da cultura indígena nos estabelecimentos de ensino do país, com essas ações a promoção da igualdade racial integra a agenda politica no pais.

Referências:

Gestão de Políticas Públicas em Gênero e Raça/GPP-GeR: módulo V/Orgs. Maria Luiza Heilborn, Leila Araújo, Andréia Barreto. - Rio de Janeiro: CEPESC; Brasília: Secretaria de Políticas para as Mulheres, 2011.


UNIDADE II
PLANEJAMENTO GOVERNAMENTAL E ORÇAMENTO PÚBLICO COM RECORTE DE GÊNERO E RAÇA

POR ANA ELISA SOUZA CARAO

O Ciclo de Políticas Públicas

As políticas transversais de gênero e raça, definidas pela Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM) e pela Secretaria de Promoção de Políticas da Igualdade Racial (SEPPIR), são executadas em órgãos setoriais que seguem procedimentos de planejamento e orçamento de acordo com a legislação vigente.
No Brasil, a Constituição Federal define as leis de planejamento e orçamento.
Este modelo que considera as políticas públicas como um processo, consolidado em um conjunto de atividades desenvolvidas, para atender às demandas e aos interesses da sociedade. Tal processo envolve a preparação da decisão política, a formação da agenda, a formulação, a implementação e a avaliação.
O projeto é a unidade mínima de destinação de recursos que, por meio de um conjunto integrado de atividades, pretende transformar uma parcela da realidade, suprindo uma carência ou alterando uma situação-problema.
Os termos projeto, programa e plano designam modalidades de intervenção social que diferem em escopo e duração. O conjunto de projetos que visam aos mesmos objetivos é denominado programa, que “estabelece as prioridades da intervenção, identifica e ordena os projetos, define o âmbito institucional e aloca os recursos a serem utilizados”. O plano, por sua vez, contém os programas, que também abarcam os projetos (Cohen & Franco, 1993).

Instrumentos de Planejamento e Orçamento

Orçamento público é um instrumento utilizado pelos governos para organizar seus recursos financeiros, e reflete as políticas públicas. O orçamento não pode ser apenas visto como um instrumento técnico ou uma ferramenta de alocação, pois se trata, de fato, de um espaço de poder, no qual são distribuídos os recursos a partir da definição das prioridades nacionais. Os Planos Plurianuais determinam quais são as prioridades e como se dá a alocação de recursos. São peças fundamentais no ciclo de políticas públicas.

No Brasil, até a década de 1960, aplicava-se a técnica tradicional de orçamentação, na qual o orçamento se restringia à previsão da receita e à autorização da despesa. O foco se concentrava no controle contábil do gasto e no detalhamento da despesa. O Decreto-lei nº 200 de 1967 introduziu a técnica orçamentária orçamento-programa, que se consolidou em 1974, quando a Portaria do Ministério do Planejamento instituiu a classificação funcional programática.
A Constituição Federal de 1988 instituiu o Plano Plurianual (PPA) como principal instrumento de planejamento de médio prazo do governo brasileiro. Ele consiste em um planejamento governamental de quatro anos, compreendendo o segundo ano do governo corrente e o primeiro ano do governo subseqüente.
A Constituição Federal desempenhou relevante papel nesse momento ao instituir, conjuntamente, em seu artigo 165 os instrumentos de planejamento e o orçamento: Plano Plurianual (PPA); a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e a Lei Orçamentária Anual (LOA).
O Plano Plurianual é considerado a lei de maior alcance para o estabelecimento das prioridades e o direcionamento das ações do governo.
A Lei de Diretrizes Orçamentárias orienta a elaboração da lei orçamentária anual, dispõe sobre as alterações na legislação tributária e estabelece a política de aplicação das agências financeiras oficiais de fomento. É função da LDO adequar as diretrizes e os objetivos do PPA para o período de um ano, indicando as metas e as prioridades e orientando na elaboração do orçamento.
A Lei Orçamentária Anual estima as receitas que a União deverá arrecadar e fixa as despesas públicas para cada ano. Ela contém o detalhamento da programação dos gastos públicos e deve ser compatível com o PPA, seguindo as orientações e as diretrizes definidas na LDO.
A LDO é o conjunto de leis que determina a responsabilidade para conduzir o orçamento público. Nela estão discriminadas as receitas e as despesas de uma administração para o ano fiscal (iniciado em janeiro e com conclusão em dezembro).
Neste modelo de ciclo orçamentário, a iniciativa das três leis é prerrogativa do Poder Executivo. Os projetos de lei referentes a cada um destes instrumentos (PPA, LDO e LOA) são aprovados pelo Congresso Nacional, que pode apresentar emendas aos projetos; após votação em plenário, cabe ao presidente da República aprová-las ou vetá-las, parcial ou integramente.
A integração dos instrumentos de planejamento e orçamento (PPA, LDO e LOA), associada à transformação da estrutura programática em instrumento de gestão, exigiu mudanças estruturais na administração pública. Os processos inerentes a planejamento, orçamento, finanças e controle passaram a coexistir sob uma agenda única, tornando-se interdependentes.
O controle social sobre as três fases do ciclo orçamentário deve ser realizado, tendo em vista os seguintes objetivos:
1. Defesa e garantia da aplicação dos recursos públicos nas políticas sociais;
2. Controle das revisões anuais do PPA;
3. Controle dos recursos previstos e dos efetivamente aplicados;
4. Monitoramento dos processos de elaboração do orçamento para que sejam transparentes, democráticos e participativos;
5. Garantia da incorporação da perspectiva da igualdade de gênero e raça nas políticas públicas e prioridades dos gastos públicos dirigidos às mulheres.
O PPA é constituído basicamente por dois grandes módulos: a base estratégica e os programas. A primeira estabelece a análise da situação econômica e social, as diretrizes, os objetivos e as prioridades estabelecidos pelo chefe do Poder Executivo, a previsão dos recursos orçamentários e sua distribuição entre os setores e os programas. Os programas compreendem a definição dos problemas e o conjunto de ações que deverão ser empreendidas para atingir os objetivos estabelecidos.
O programa é estabelecido no PPA como um conjunto articulado de ações (projetos, atividades, operações especiais e ações não-orçamentárias), estruturas e pessoas motivadas na direção de um objetivo comum. Os programas que compõem o PPA são elementos de integração entre o planejamento, o orçamento e a gestão. Para a elaboração de programas do PPA, problemas são demandas não satisfeitas ou carências identificadas que, quando reconhecidas e declaradas pelo governo, passam a integrar sua agenda de compromissos.
Uma vez definido um problema, suas causas se tornam objeto de ações visando superá-las ou reduzi-las. Assim, é fundamental a distinção entre causa (origens do problema) e efeitos (produtos da causa).

Políticas Públicas de Gênero e Raça

As políticas públicas atingem mulheres e homens de forma desigual, assim como afetam de maneira diversa os grupos étnico-raciais. Inserir as perspectivas de gênero e raça no orçamento é, portanto, reflexo da preocupação em implementar tais políticas, garantindo os recursos para sua execução.
Nas últimas décadas o conceito “orçamento sensível a gênero” recebeu ênfase. Ele não diz respeito a um orçamento específico para as mulheres, mas à orientação das finanças e dos gastos públicos na direção do enfrentamento das desigualdades vividas pelas mulheres. A análise do orçamento concebida deste modo busca compreender as implicações de qualquer forma de gasto ou método de arrecadação de recursos públicos para enfrentar as desigualdades ou no que tange à sua produção e reprodução.
Historicamente, a ação do Estado tem produzido e mantido essas desigualdades. Planejar a política pública a partir da perspectiva de gênero e raça exige reconhecer, enfrentar e eliminar os mecanismos de perpetuação das desigualdades e construir alternativas, no sentido da realização plena e progressiva dos direitos humanos de todas as mulheres e das pessoas pertencentes aos segmentos raciais discriminados. Uma ferramenta é fundamental para o planejamento da política pública a partir da perspectiva de gênero e raça, com base nestes princípios e diretrizes: o diagnóstico das desigualdades de gênero e raça.
É importante que a análise de gênero reconheça esse caráter multidimensional da desigualdade, decifrando as variadas formas de opressão vividas pelas mulheres, nos diferentes grupos sociais em que estão inseridas. O enfrentamento dessas múltiplas formas de discriminação demanda atenção especial e apoio efetivo das políticas públicas, para que as mulheres de diferentes contextos possam superar situações difíceis, condições históricas de privação, como é o caso, por exemplo, das mulheres indígenas e negras em sociedades de passado escravagista, como a brasileira.
De uma perspectiva de gênero, há grande diferença entre ter acesso e controle. As mulheres podem ter acesso a uma propriedade, mas não o controle sobre seu uso; acesso à renda, mas não sobre os gastos; participação em processos políticos, mas não poder de decisão. Portanto, o planejamento da política pública, deve estabelecer medidas que garantam que seu desenvolvimento viabilize a equidade entre mulheres e homens.

O Papel dos Indicadores na Formulação de Políticas, Programas e Projetos

Indicadores sociais são medidas que operacionalizam um conceito abstrato ou processo decisório, consistindo em ferramentas fundamentais para a visualização e o entendimento dos problemas sociais. Os indicadores são subsídios indispensáveis nos processos de tomada de decisão, nas fases de formulação e na implementação de políticas, programas e projetos.
Assim, os indicadores de diagnóstico possuem amplitude temática e larga escala, enquanto os indicadores para a formulação tendem a ser sintéticos, associando múltiplos critérios para a tomada de decisões.

a) Indicadores de diagnóstico
O diagnóstico do problema e/ou da situação sobre a qual se pretende atuar é o ponto de partida para o processo de planejamento. Trata-se de um “retrato” da realidade que deverá sofrer uma forma de intervenção – mais ou menos profunda, de acordo com a extensão ou os objetivos propostos.

b) Indicadores de gênero e raça
A construção e a seleção de indicadores dependem da qualidade das informações geradas (base de dados) e da disponibilidade e da qualidade dos dados secundários para embasamento do processo decisório. Há um consenso entre estudiosos e planejadores/formuladores de políticas públicas sobre a importância da existência de dados para a construção dos indicadores que irão nortear e apoiar estudos e processos de formulação e implementação de políticas públicas, programas e projetos (Jannuzzi, 2000; Cohen & Franco, 1993).

O Desafio da Gestão de Gênero e Raça

O orçamento público conecta e põe em prática os enunciados e os compromissos de políticas públicas de igualdade de oportunidades para homens e mulheres, permite visualizar operativamente como são gastos os recursos, quanto e como o Estado investe em diversos níveis, em políticas a favor da igualdade.
Nesta perspectiva, a gestão é entendida como uma instância de controle ou de aferição permanente da relação entre os objetivos, os recursos (ou insumos), os procedimentos adotados e os resultados esperados.
Vale ressaltar que o princípio da transversalidade de gênero e raça/etnia na formulação das políticas públicas foi explicitado e definido como um desafio da gestão pública já no PPA 2004-2007, a partir do entendimento de que estas categorias constituem dimensões estruturantes das desigualdades sociais. À ocasião, entre os desafios destacados para a gestão federal, constavam: promover a redução das desigualdades raciais e das desigualdades de gênero. A promoção da igualdade de gênero e raça/etnia foi enunciada no 4º objetivo estratégico da seguinte forma: “Fortalecer a democracia, com igualdade de gênero, raça e etnia, e a cidadania com transparência, diálogo social e garantia dos direitos humanos”. Isto significa que, na elaboração do planejamento plurianual, os diferentes ministérios e secretarias devem considerar estas dimensões como estratégicas para o alcance do objetivo maior deste governo, que é a inclusão social e a redução das desigualdades.

Sistemas de Informações relativos às Políticas de Gênero e Raça
Diante do desafio da implementação dos programas inseridos no PPA com recorte de gênero e raça, é relevante a criação de um sistema que seja capaz de agregar dados e informações para subsidiar a implementação, o monitoramento e a avaliação dos programas e das ações. Além disso, é preciso mapear o perfil e as demandas do público-alvo, a exemplo do Sistema Nacional de Indicadores de Gênero (SNIG), da Secretaria de Políticas para as Mulheres. O SNIG foi implantado em parceria com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Department of  International Development do Reino Unido (DFID), o Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas para a Mulher (Unifem) e o Instituto Brasileiro de Administração Municipal (IBAM). O Sistema presta informações sobre a mulher e seus dados são extraídos dos Censos Demográficos de 1991 e de 2000.
A SPM vem se consolidando como uma referência na temática de gênero perante a sociedade civil e assume também a atribuição de dar visibilidade à situação das mulheres no Brasil, promovendo, por diversos meios, a divulgação de informações confiáveis sobre a temática de gênero e raça em seus diferentes aspectos ou dimensões.

A Gestão do II Plano Nacional de Políticas para as Mulheres

Do ponto de vista da gestão do II Plano Nacional de Políticas para as Mulheres, é preciso salientar a preocupação em articulá-lo com o PPA 2008-2011, garantindo, assim, um compromisso mais efetivo de todos os setores envolvidos com as políticas de promoção da igualdade de gênero e da autonomia das mulheres. Esses avanços também se tornaram visíveis pela inclusão, na nova versão do Plano, de ações da Agenda Social dos setores de governo que atuam em prol da igualdade de gênero. Em termos objetivos isto significa, de um lado, o fortalecimento de parcerias e ideais comuns ou, no mínimo, convergentes, no âmbito do poder público. Por outro lado, trata-se da permeabilidade de uma teia de relações, que aproxima governo e sociedade, reconhecendo e unificando as interfaces dos movimentos sociais em seus diferentes segmentos.
A concretização dos objetivos do PNPM exige o investimento de um montante expressivo de recursos não somente por parte da SPM, como também de outros ministérios e secretarias que desenvolvem ações específicas para a promoção da igualdade entre homens e mulheres ou que conseguem, nos programas existentes, tornar realidade a perspectiva da transversalização de gênero.
Acrescente- se que a atuação governamental tem tradicionalmente sido marcada por um tratamento setorial, com baixo nível de articulação e integração entre as ações, bem como por uma relativa invisibilidade e uma suposta neutralidade das políticas quanto às questões de gênero, raça, orientação sexual, entre outras. Sendo assim, o II PNPM procura avançar nesta questão, trabalhando para que as ações apresentem um rebatimento orçamentário, tanto em termos de montante de recursos destinados quanto em relação à fonte desses recursos. Isto representa também uma inovação, pois cria a possibilidade de, pela primeira vez, se vislumbrar a estimativa global dos recursos destinados pelo governo federal às atividades voltadas para as mulheres.
Em alguns casos ainda não foi possível desagregar do total de recursos previstos no PPA dos/as ministérios/secretarias o montante que seria alocado especificamente para as mulheres nas ações dispostas neste II PNPM. Reforça-se, assim, a necessidade de sensibilização para a questão de gênero e raça junto aos governos federal, estadual, distrital e municipal, no momento de definição de parâmetros e prioridades de atendimento, bem como junto aos movimentos sociais, na reivindicação do atendimento às demandas.
Vale ressaltar que os Capítulos IX e X do II PNPM: “Enfrentamento do racismo, sexismo e lesbofobia” e “Enfrentamento das desigualdades geracionais que atingem as mulheres, com especial atenção às jovens e idosas” são tratados de forma transversal a todas as ações contidas no II PNPM. Como meio de melhor implementar a articulação entre as ações de gênero e raça, e seu monitoramento, foi constituído pela Portaria n.º 36, de 7 de maio de 2009, um Grupo de Trabalho, composto por representantes de cada Subsecretaria da SPM, um/a representante, respectivamente, das Secretarias de Políticas de Promoção da Igualdade Racial e Direitos Humanos, duas representantes de entidades do movimento de mulheres negras e lésbicas com assento no Conselho Nacional dos Direitos da Mulher e, como convidadas, seis representantes da sociedade civil, do movimento de mulheres negras e lésbicas.

A Gestão do Plano Nacional de Promoção de Igualdade Racial – Planapir

O Plano Nacional de Promoção da Igualdade Racial (Planapir). Deu um passo, importante, em 2009, foi à constituição do Comitê de Articulação e Monitoramento do Planap ir. No mesmo modelo do PNPM, a concretização dos objetivos propostos no Plano exige investimentos expressivos de recursos, tanto da SEPPIR como de todos os ministérios e secretarias envolvidos com as ações específicas e transversais para a promoção da igualdade racial.

O Programa Brasil Quilombola (PBQ) foi criado em 2004, com o objetivo de coordenar as ações governamentais – articulações transversais, setoriais e interinstitucionais – para as comunidades remanescentes de quilombos, com participação da sociedade civil. O Programa é coordenado pela Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPI), por intermédio da Subsecretaria de Políticas para Comunidades Tradicionais. Suas ações são executadas por 23 órgãos da administração pública federal, além de empresas e organizações sociais.

O conjunto de ações inseridas no Programa é proveniente dos órgãos governamentais e é compatível com os respectivos recursos, constantes da lei orçamentária do Plano Plurianual, na qual também estão previstas as responsabilidades de cada órgão e os prazos de execução. A definição das ações mais apropriadas para cada instância é consolidada a partir das demandas das comunidades.
Agenda Social Quilombola tem como objetivo articular as ações existentes no âmbito do governo federal pelo Programa Brasil Quilombola (PBQ), a partir dos eixos:
acesso a terra;
infraestrutura e qualidade de vida;
inclusão produtiva e desenvolvimento local;
direitos de cidadania.
Esta ação garante a inserção das comunidades quilombolas em outro esforço de inclusão do governo federal, o Programa Territórios da Cidadania, que prevê inúmeras ações e investimentos nas regiões com os mais baixos índices de desenvolvimento humano.
Eixos de Ação da Agenda
Para garantir a execução das ações junto às comunidades remanescentes de quilombos, estão sendo instalados Comitês Gestores Estaduais. Eles já foram criados no Rio de Janeiro, Piauí, Goiás, Amapá, Minas Gerais, Sergipe, São Paulo, Bahia e Pará. A previsão é de que até meados de setembro os estados de Pernambuco, Maranhão, Rio Grande do Sul e Espírito Santo também tenham seus comitês. O trabalho dos gestores públicos é pautado por quatro eixos: regularização fundiária, infraestrutura e qualidade de vida, inclusão produtiva e desenvolvimento local, e direitos de cidadania.
A gestão da Agenda Social Quilombola (ASQ) é estruturada a partir do Comitê Gestor Interministerial, de caráter deliberativo e executivo, e dos comitês estaduais, de caráter consultivo e propositivo. O Comitê Gestor Interministerial é composto por todos os Ministérios e Secretarias Especiais (Decreto 6.261), sendo coordenado pela SEPPIR. Os comitês estaduais são importantes instâncias de gestão descentralizada do Programa Brasil Quilombola.
Possuem dinâmicas estaduais próprias, contam com uma composição mista, com integrantes do poder público (gestores municipais, estaduais e federais) e da sociedade civil (comunidades quilombolas). Os comitês objetivam o aumento do controle social e a otimização da implementação das políticas públicas nas comunidades quilombolas. Os Comitês Estaduais funcionam como elo entre a SEPPIR e os demais órgãos integrantes do Programa, os gestores estaduais e municipais e as organizações quilombolas. A participação destas últimas possibilita estabelecer o cruzamento de suas realidades, demandas e perspectivas na elaboração do planejamento, na execução, no monitoramento e na avaliação das políticas públicas.

REFERENCIA:

Gestão de Políticas Públicas em Gênero e Raça/GPP-GeR: módulo V/Orgs. Maria Luiza Heilborn, Leila Araújo, Andréia Barreto. - Rio de Janeiro: CEPESC; Brasília: Secretaria de Políticas para as Mulheres, 2011.


UNIDADE III
MONITORAMENTO E AVALIAÇÃO DE PROGRAMAS E PROJETOS

POR DAVID FELBERG


As crescentes demandas por eficiência e transparência na gestão de políticas públicas têm exigido dos órgãos governamentais um esforço contínuo de aperfeiçoamento das práticas de gestão. Por isso o uso de técnicas de monitoramento e avaliação para aferir resultados torna-se de fundamental importância para se ter uma melhor compreensão da eficiência, eficácia e efetividade das políticas públicas. Por mais que a expressão “monitoramento e avaliação” rotineiramente têm a tendência de ser entendida como se parecesse uma única coisa, são duas formas de atividades organizacionais relacionadas, porém não são idênticas. Enquanto o monitoramento consiste na coleta sistemática e na análise da informação de como uma política pública progride, a avaliação é tida como um processo sistemático de análise que permite compreender, de forma contextualizada, todas as dimensões e as implicações de uma ação para estimular seu aperfeiçoamento. A avaliação tem como finalidade saber quem demanda informações e para que elas servirão. Após avaliação final de uma política, programa ou projeto, é importante que o gestor ou coordenador da atividade em curso se preocupe com a permanência dos resultados da ação tanto a médio quanto em longo prazo. Nesse sentido, a implantação de sistemas de indicadores constitui o aprimoramento das práticas de planejamento e gestão sendo fundamental para modernizar o aparelho administrativo e orientar a racionalização do gasto público. É importante lembrar que a produção e a divulgação de informações confiáveis constituem princípios básicos da transparência das ações governamentais – o que por sua vez, representa condição indispensável para a prática do controle social, uma exigência do modelo administrativo, que informa o PPA em qualquer instância do poder público. Assim a revisão dos programas conclui o ciclo de gestão, introduzindo as recomendações de aperfeiçoamento, provenientes da avaliação, na gestão e na concepção dos programas que integrarão a proposta de revisão do PPA e do Projeto de Lei Orçamentária Anual, ou seja, os resultados da avaliação ajudam a apontar problemas de execução e indicam oportunidades de melhoria na programação dos órgãos.

REFERENCIA:

Gestão de Políticas Públicas em Gênero e Raça/GPP-GeR: módulo V/Orgs. Maria Luiza Heilborn, Leila Araújo, Andréia Barreto. - Rio de Janeiro: CEPESC; Brasília: Secretaria de Políticas para as Mulheres, 2011.

UNIDADE IV
ELABORAÇÃO DE PROJETOS E LEGISLAÇÕES

POR ANDRESSA RODRIGUES

A unidade 4 abordou vários conceitos referentes à elaboração e legislação de projetos relacionados às políticas públicas. Vejamos alguns conceitos e discussões abordados:
Por meio da leitura e reflexão dos textos da unidade 4 do módulo 5, disponíveis pelo curso de GPP-GêR, percebe-se que nas interações sociais os indivíduos constroem e desenvolvem práticas culturais localizadas espacial e temporalmente. Assim, atuam como agentes, produzindo e incidindo cotidianamente na vida em sociedade.

O PLANEJAMENTO OMO ALICERCE INSTRUMENTAL DA GESTAO

Segundo Baptista (2000), o planejamento, parte integrante das ações de um projeto, pode ser entendido como a etapa em que se determina como será a execução de todas as ações, bem como seu acompanhamento. É nesse momento que são deliberadas as prioridades de intervenção além da definição dos objetivos e metas a serem alcançados, levando em consideração os recursos disponíveis e os prazos estabelecidos. Durante o momento do planejamento é importante que o gestor tenha a preocupação ainda de fazer o Diagnóstico da situação sobre a qual pretende atuar como forma de levantar dados sobre o público-alvo facilitando o foco no planejamento das ações, que deve ser sempre a meta ou objetivo geral do projeto.
O termo gestão, conforme o dicionário Aurélio, caracteriza-se pelo ato de administrar, gerir e para isso exige um profissional que seja capacitado para que este consiga planejar e organizar as atividades necessárias para um bom desempenho do processo. Sendo assim, o gestor público deve trabalhar com objetivo central de dar respostas às demandas dos usuários, garantindo o acesso aos direitos sociais assegurados na Constituição Federal.
De acordo com Carvalho (1999) este processo pode ser caracterizado como uma gestão social:
A gestão social refere-se à gestão das ações sociais públicas. A gestão  do social é, em realidade, a gestão das demandas e necessidades dos cidadãos. A política social, os programas sociais, os projetos são canais a estas respostas a estas necessidades e demandas (CARVALHO, 1999, p. 19).
A atual conjuntura que vive nossa sociedade requer um profissional qualificado, crítico, não apenas executivo, mas que planeja, investiga, pesquisa e decifra a realidade, a fim de propor mudanças nas relações desiguais como gênero e raça, por exemplo. Portanto o gestor público deve ser compreendido como um profissional a serviço da sociedade, buscando desenvolver a real promoção humana, na qual o homem, cidadão, enquanto sujeito de direitos, alcance a capacidade de pensar e agir sobre sua condição de vida e, por fim, exercer de fato, a cidadania.
É essencial que o/a gestor/a tenha consciência de que sexismo, racismo e disparidades de gênero e intragênero funcionam como mecanismos estruturantes das desigualdades, e que o combate ao sexismo, ao racismo e a toda e qualquer outra forma de discriminação requer a criação de políticas e de ações afirmativas, com a perspectiva de garantir a igualdade de direitos entre homens e mulheres, entre brancos/as e negros/as.
Diante disso, o planejamento configura-se como a possibilidade de estabelecer um caminho para a ação, fixar os objetivos a serem alcançados, calcular as atividades e os meios para torná-los possíveis em determinado intervalo de tempo. Um bom planejamento na área da gestão de projetos é uma condição para que se viabilize o alcance das metas e o domínio das diferentes etapas do processo.
Alguns elementos devem ser considerados na construção dessa cultura da gestão, dentre os quais enfatizam-se o compromisso ético, o perfil de gestor/a e o conhecimento do contexto.
O compromisso ético é entendido para além de um conjunto de valores morais fundados na lisura e na honestidade, mas como uma atitude de comprometimento da/o gestora/o com os resultados efetivos das ações, com as expectativas do público-alvo e, ainda, com a transformação positiva das condições sociais.
No que se refere ao perfil, o/a gestor/a deve buscar uma visão crítica, interrogando-se continuamente sobre o sentido de seu agir, com condições de explicitar os problemas que possam surgir no decorrer do processo. O/A gestor/a, planejando bem as ações, será capaz de identificar suas limitações e recorrer à formação complementar, ou ainda, quando perceber que não tem condição de sanar um problema sozinho/a, capacitar os/as executores/as por meio de contratação de consultoria ou cooperação técnica com especialista.
Completando o tripé de elementos que perfazem o que denominamos de cultura da gestão, está o conhecimento do contexto de intervenção, abordado aqui como condição intrínseca ao papel do/a gestor/a e elemento imprescindível à realização de seu planejamento.
A importância de investigar, identificar e compreender as demandas sociais Conforme abordado anteriormente, é imprescindível que o/a gestor/a conheça o contexto em que irá desenvolver determinado projeto social e tenha condições de planejar e definir ações que alterem de forma positiva a situação. Espera-se também que, distinguindo as variáveis que implicam a resolução de um problema, adquira-se uma noção realista do esforço, assim como do custo necessário à intervenção.
Na linguagem de gestão de projetos, o diagnóstico consiste na análise da situação-problema ou da realidade sobre a qual se pretende atuar.
Além de conhecer o público-alvo, o/a gestor/a deve saber que a focalização é mais um dos critérios utilizados para formular projetos, pois recorta com maior precisão os/as reais beneficiários/as diretos/as do projeto. Portanto, focar significa uma atuação direcionada ao público-alvo estabelecido, atentando para as distintas particularidades e especificidades, em nosso caso, das mulheres. Por esta razão, é preciso conhecer detalhadamente as características do público-alvo, pois somente assim será possível desenhar um projeto adequado às suas necessidades e características socioculturais.
Um último aspecto a ser destacado consiste no papel dos/as beneficiários/as do projeto. Um/a gestor/a que conhece o público-alvo com o qual vai atuar e a complexidade da problemática em que este grupo está inserido deve ser capaz de envolvê-lo no processo de transformação de determinada realidade. Ressalta-se que a população beneficiária é grande conhecedora de suas reais necessidades, uma vez que vivencia os problemas em seu cotidiano.

A RELEVÂNCIA DA DISPONIBILIDADE DOS RECURSOS

Na gestão de políticas públicas é necessário saber operar diferentes recursos para o sucesso de um empreendimento. Um pressuposto relevante é a avaliação exata ou, pelo menos, aproximada dos recursos disponíveis ao gerenciamento. O ato de avaliar possibilita não apenas conhecer a dimensão das condições já existentes, como também propicia saber quais meios serão necessários para atingir os objetivos esperados. Portanto, planejar adequadamente a gestão garante a racionalidade no uso dos recursos.
Os três elementos que constituem os meios para a execução de um projeto – recursos humanos, materiais e financeiros – precisam ser pensados e estar associados. Um projeto tende ao fracasso quando dispõe de uma quantidade significativa de insumos financeiros, mas seus recursos humanos não são apropriados. Nesse caso, um plano de trabalho bem feito identificará esta carência e irá saná-la, seja com capacitação da equipe envolvida, seja mediante contratação de profissionais especializados/as antes do desenvolvimento das atividades. Da mesma maneira, o conjunto de recursos humanos deve estar articulado e corresponder ao montante de equipamentos disponíveis ou necessários à efetivação de um projeto. Em outros termos, uma gestão planejada reflete o controle preciso das ações, dos recursos mobilizados, dos anseios dos/as envolvidos/as e dos resultados.
Na acepção geral, projetos são ferramentas de ação que delimitam uma intervenção quanto aos objetivos, metas, formas de atuação, prazos, responsabilidades e avaliação. Projetos sociais constituem uma forma de organizar ações para transformar determinada realidade social; são construções de um grupo de pessoas que deseja transformar boas ideias em boas práticas. Projetos sociais locais bem-sucedidos, elaborados e implementados pela sociedade civil organizada podem e devem, inclusive, integrar-se às ações de governo municipais, estaduais ou de instância federal e, assim, serem replicados em escala maior, gerando políticas públicas, cujos impactos para a coletividade serão mais substantivos e benéficos.

ROTEIRO PARA ELABORAÇÃO DE PROJETOS

Vejamos, resumidamente, os itens necessários para a elaboração do Projeto Básico e do Plano de Trabalho com foco em gênero e raça.
1. Projeto Básico : devem ser detalhadas todas as informações técnicas necessárias ao apoio financeiro. Segue-se, basicamente, o seguinte roteiro:
1.1 Considerações Gerais sobre a instituição proponente: Explicitar a natureza e os objetivos do órgão ou instituição, bem como seu comprometimento com as políticas de promoção da igualdade de gênero e/ou de raça, e a ligação do projeto com a efetivação das ações governamentais previstas nos planos, nos programas e nas ações em vigor.
1.2 Justificativa: Fundamentar a pertinência e a relevância do projeto como resposta a um problema ou necessidade identificada de maneira objetiva, enfatizando os aspectos qualitativos e quantitativos.
1.3 Objetivos: definir o que se pretende alcançar com o projeto.
1.4 Objetivos Específicos: devem ser realizados durante o prazo estipulado para a conclusão do projeto.
1.5 Metas/Produtos/Resultados Esperados: devem ser concretas e expressar a quantidade e a qualidade do objetivo.
1.6 Público-alvo: serão os/as beneficiários/as diretos/as do projeto.
1.7 Metodologia/Estratégia de Ação: explicar como o projeto vai atender aos seus objetivos.
1.8. Prazo: duração do projeto, preferencialmente em dias ou meses.
1.9 Sustentabilidade: é preciso descrever de que modo o projeto terá continuidade após seu término.
1.10 Detalhamento dos Custos: o detalhamento deverá ser apresentado por meio de uma tabela, na qual constará a descrição de todos os itens, quantidades e valores unitários e totais a serem financiados com recursos públicos.
1.11 Declaração de Contrapartida: refere-se aos recursos financeiros que deverão ser oferecidos pelo/a proponente para o desenvolvimento do projeto.
1.12 Declaração de Adimplência: atestando que a mesma não se encontra em débito junto a qualquer órgão da administração pública.
2. Plano de Trabalho: os dados cadastrais da instituição proponente e um resumo do projeto. O Plano de Trabalho é uma forma mais objetiva de apresentar o Projeto Básico. Assim, é composto por algumas planilhas, que buscam contribuir para melhor planejar a implementação do projeto.
As planilhas consideradas essenciais:
2.1 Cronograma de Execução: deverá retratar as metas e as etapas, com as especificações, o indicador físico, o valor, as realizações físicas de acordo com as unidades de medidas, a unidade de medida, o início e o término da execução de cada uma até a finalização do prazo previsto para a conclusão do projeto.
2.2 Plano e Aplicação: refere-se ao desdobramento da alocação dos recursos no transcorrer do projeto.
2.3 Cronograma de Desembolso
a. Do Concedente: preencher, dividindo o valor total do projeto em, no máximo, duas parcelas, se possível, prevendo os valores que serão gastos com as etapas a serem realizadas naquele período.
b. Do Proponente: registrar o valor a ser desembolsado pelo proponente.


FORMALIZAÇÃO DE CONVÊNIOS E DA PRESTAÇÃO DE CONTAS, TERMO DE COOPERAÇÃO E TERMO DE PARCERIAS.

Nos termos do Decreto nº 6.170/2007, e suas alterações, e da Portaria Interministerial nº 127/2008, dos Ministérios do Planejamento, Orçamento e Gestão, da Fazenda, e do Controle e da Transparência, a execução descentralizada de Programa, projetos e atividades de interesse recíproco a cargo de órgãos e entidades da Administração Pública Federal, que envolva a transferência de recursos financeiros oriundos de dotações consignadas nos Orçamentos Fiscal e da Seguridade Social da União, será efetivada mediante a celebração de Convênios, Contrato de Repasse, Termo de Cooperação.
A execução descentralizada acima citada será efetuada por órgãos ou entidades publicas
ou por entidades privadas sem fins lucrativos. A Portaria interministerial além de servir como fonte primária na elaboração das cláusulas dos instrumentos, dispõe acerca da celebração de convênios, contrato de repasse, e termos de cooperação, de suas condições, credenciamento, proposição, cadastramento, formalização, alteração, execução, liberação de recursos, pagamentos, acompanhamento e fiscalização, prestação de contas, rescisão, padronização dos objetos, e por fim, Tomada de Contas Especial, que ocorre para apurar os fatos, identificar os responsáveis e quantificar o dano, quando não apresentada ou não aprovada à respectiva prestação de contas.
É importante ressaltar que além desses Instrumentos Normativos mencionados no item acima, também deverão ser observadas ainda os dispositivos legais que fundamentam o presente documento, quais sejam, a Constituição Federal Brasileira, a Lei n° 8.666/1993, e suas alterações, a Lei nº 10.520/2002, o Decreto nº 5.450/2005, a Lei nº 9.790/1999 e o Decreto nº 3.100/1999. 

ALGUNS CONCEITOS IMPORTANTES NA FORMULAÇAO DE CONVENIO

Convênio – acordo, ajuste ou qualquer outro instrumento que discipline a transferência de recursos financeiros de dotações consignadas nos Orçamentos Fiscal e da Seguridade Social da União e tenha como partícipe, de um lado, o ICMBio, e, de outro lado, órgão ou entidade da administração pública estadual, distrital ou municipal, direta ou indireta, ou ainda, entidades privadas sem fins lucrativos, visando à execução de programa de governo, envolvendo a realização de projeto, atividade, serviço, aquisição de bens ou evento de interesse recíproco, em regime de mútua cooperação;

Contrato de Repasse – instrumento administrativo por meio do qual a transferência dos recursos financeiros se processa por intermédio de instituição ou agente financeiro público federal, atuando como mandatário da União;

Termo de Cooperação – instrumento de descentralização de crédito entre o ICMBio e órgãos da administração pública federal direta, autarquias, fundação pública, ou empresa estatal dependentes federais, para executar programa de governo, envolvendo projeto, atividade, aquisição de bens ou evento, mediante portaria ministerial e sem a necessidade de exigência de contrapartida. Os Termos de Cooperação não serão registrados no SICONV;

Termo de Parceria – instrumento firmado com transferência de Recursos orçamentários, entre o ICMBio e Organizações Sociais de Interesse Público – OSCIPs nos termos da Lei nº 9.790/1999, regulamentada pelo Decreto nº 3.100/1999;

SICONV – Sistema de Gestão de Convênios e Contratos de Repasse – SICONV, do Governo Federal, coordenado pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, no qual serão realizados os atos e os procedimentos relativos à formalização, execução, acompanhamento, prestação de contas e informações acerca de Tomada de Contas Especial dos convênios, contratos de repasse e termos de cooperação (esse sistema é aberto à consulta pública, por meio do Portal dos Convênios).

Projeto Básico – conjunto de elementos necessários e suficientes, com nível de precisão adequado, para caracterizar a obra ou serviço, ou complexo de obras ou serviços, elaborado com base nas indicações dos estudos técnicos preliminares, que assegurem a viabilidade técnica e o adequado tratamento do impacto ambiental do empreendimento, e que possibilite a avaliação do custo da obra ou serviço de engenharia e a definição dos métodos e do prazo de execução;

Termo de Referência – documento apresentado quando o objeto do convênio contrato de repasse ou termo de cooperação envolver aquisição de bens ou prestação de serviços, que deverá conter elementos capazes de propiciar a avaliação do custo pelo ICMBio, diante de orçamento detalhado, considerando os preços praticados no mercado, a definição dos métodos e o prazo de execução do objeto;
O projeto básico ou o termo de referência é peça fundamental para a celebração do convênio e deve ser anexado ao SICONV para análise prévia, ou seja, antes da assinatura do convênio.

O Plano de Trabalho incluído no SICONV pelo proponente, será avaliado após a efetivação do cadastro e conterá, no mínimo:
I – justificativa para a celebração do instrumento;
II – descrição completa do objeto a ser executado;
III – descrição das metas a serem atingidas;
IV – definição das etapas ou fases da execução;
V – cronograma de execução do objeto e cronograma de desembolso; e
VI – plano de aplicação dos recursos a serem desembolsados pelo concedente e da contrapartida financeira do proponente, se for o caso.

A prestação de contas será composta, além dos documentos e informações a serem apresentados pelo convenente ou contratado no SICONV, do seguinte:
I – Relatório de Cumprimento do Objeto;
II – declaração de realização dos objetivos a que se propunha o instrumento;
III – relação de bens adquiridos, produzidos ou construídos, quando for o caso;
IV – a relação de treinados ou capacitados, quando for o caso;
V – a relação dos serviços prestados, quando for o caso;
VI – comprovante de recolhimento do saldo de recursos, quando houver; e
VII – termo de compromisso por meio do qual o convenente ou contratado será obrigado a manter os documentos relacionados ao convênio ou contrato de repasse.

REFERÊNCIA:


HEILBORN, Maria Luiza; ARAUJO, Leila; BARRETO, Andréia (Orgs). Gestão de políticas públicas em gênero e raça/GPPGR: módulo V. Rio de Janeiro: CEPESC; Brasília: Secretaria de Políticas para as Mulheres, 2010.